sábado, 3 de julho de 2010

A palavra que não diz

“falas de amor pra mim, eu ouço tudo e calo” – Augusto dos Anjos

Mais que dia ensolarado. Repleto de emoções aos que querem tê-las. E eu a cada dia mais lúcido. Sim, lúcido. Insano e lúcido. Vejo os carros que passam. As pessoas que choram e riem. Os cachorros que coçam sua sarna e os gatos que pulam nos telhados na madrugada; escuto os ratos roerem toda a consciência humana debaixo do assoalho. Tenho medo, e meu medo não este medo que a humanidade sova todos os dias. Tenho medo da falta de medo que sinto. Medo da falta de tudo que me assola. Não temos mais o Futuro, não temo os inimigos, não temos a morte e nem mais a miséria.
Nesta semana, como uma guilhotina justiceira minha consciência desceu graciosa e certeira à jugular. Não estou triste. Não estou feliz. Estou lúcido, consciente. Todo e qualquer receio ou preocupação que me dilacerava morreu ontem à noite. Tudo se tornou medo de criança, e de alguma forma eu cresci (ainda não descobri se isso é bom ou ruim).

Vejo os amantes, ouço as juras de amor. Tudo me parece tão falho. Sem alma, sem vida... Que amor é esse que vocês amam? Este amor que fala e não vê, que ri e não chora. Que juras são essas que jurais? Por que fala da eternidade sem mesmo a conhecer? E digo não só porque já ouvi e disse tudo isso, mas sim, porque ouço a cada esquina, nas pessoas que não conheço, nas que costumo ver, nas que amo... Coitados!

Penso, muitas vezes, que sou uma criatura metamorfa retirada de um quadro de Dali. Eu não quero ter emoções, eu não quero ser estéril. Quero apenas viver. Algo além da sorte e do azar, do amor e do ódio que nem Deus e nem o Diabo possam intervir sobre esse ser fantástico que cá escreve no Terra Efêmera.

Escutem. Estão ouvindo? Não? É Réquiem! Não? Nada? E nem estão vendo isso imagino eu... São os guerreiros do Apocalipse jogando cartas, truco talvez. Sentem esse gosto? Agri-doce. E o cheiro de ferro? Nada não? Enfim, coitados... Coitados...

Temos mania de dizer que os mortos não falam, porém os vivos também não dizem nada. Como já disse Graciliano, a palavra foi feita pra dizer e não para enfeitar. Prefiro o silêncio do sepulcro aos adornos da boca imatura.

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