quarta-feira, 9 de junho de 2010

Um Paciente Fantástico

" e Deus criou o homem à sua semelhança..."

Moisés, mais conhecido como Dr. Matarazzo, psicólogo renomado, pós-doutorado, sua fama era de grande porte em todo o país e em alguns países da América do Norte já se falavam muito sobre seus êxitos profissionais. Recentemente abriu um escritório na cobertura do arranha - céu mais alto da cidade. Certo dia recebera um e-mail marcando uma consulta; e nele era pedido privacidade absoluta para um dia inteiro. Dinheiro não é problema – foi frisado bem no e-mail, no qual também seguia algumas recomendações para o Dr., quando o paciente entrasse o Dr. não poderia, de maneira alguma, olhar para seu paciente, deveria permanecer de costas para ele o tempo todo, desde a hora que ele entrasse a hora que ele saísse. Dizia que se fosse possível, marcasse a consulta para o próximo domingo e mais nada. E assinou o e-mail “Grato, Senhor.” E o que mais intrigou o Matarazzo foi que não havia remetente do e-mail, entretanto o fato de ganhar por um dia inteiro de consulta o fez esquecer todos estes pormenores. Mas que estranho, deve ser um caso muito interessante! – pensou Dr. Matarazzo.
- Senhorita Madalena, preciso que venha trabalhar no próximo domingo. – exigiu o Dr. a sua secretária.
- Impossível Dr., esqueceu-se que é o dia de meu casamento? – lembrou.
- Eu pago o triplo do que pagaria!
- Desculpe-me Dr., mas é o dia mais importante de minha vida, infelizmente não poderei...
- Tudo bem então, eu venho só. Bom saber que posso contar com meus funcionários! – ironizou o Dr. já desligando o telefone.
Os dias foram passando lentamente. As suas consultas demoravam décadas para terminar tanta era sua ansiedade para saber como seria o seu domingo e maior ainda a sua curiosidade de quem seria o tal Senhor. Será uma celebridade? Um ricaço? Algum empresário? Não conseguia pensar em alguém tão importante assim...
Na sexta-feira uma quantia considerável de dinheiro foi depositada na conta do Dr., era óbvio foi o tal Senhor! O que aumentou sua curiosidade de tal forma que não dormiu na sexta. E seu sábado foi inquietante que não conseguiu comer quase nada a não ser uns pedaços de pão com algumas taças do seu vinho favorito.
Eram cinco e quarenta da manhã do domingo e Matarazzo já estava no consultório, afinal não sabia ao certo que horas chegaria o tão esperado e ansiado Senhor. E foi quando as dez e trinta e três um bilhete passou livre por debaixo da porta e nele dizia assim:
“Sente-se em sua cadeira e vire-a de costas para o divã. De maneira alguma olhe para mim em momento algum. Obrigado meu filho”
Sorriu uma interrogação que até parecia alegria. Estava eufórico. Seguiu as recomendações a risca e antes mesmo que dissesse um “pode entrar Senhor”, a porta se abriu, e era como se o próprio som do mundo tivesse desaparecido do consultório. Um silêncio absurdo, somente os passos do Senhor batia no assoalho e o som de seu corpo deitando no divã...
Matarazzo transpirava. Queria olhar para trás, sabia que não podia. Segurou sua ansiedade colossal e disse tão baixo que nem mesmo ele ouvira:
- Diga-me como está? Como se sente?
“Eu...
(Que voz é essa? Não é alta, mas, parece que fala dentro de mim. – pensou enquanto ouvia)
... Eu sou Deus. Não um Deus qualquer. Deus de verdade! Mas não sei se posso sê-lo...
- Uhm... Entendo. – disse, mas, seu pensamento batia forte nos sentido de que levaria alguém achar que poderia ser Deus; pensava nas teorias dos pensadores e nada encontrava sobre tal assunto.
“Sei o que está pensando meu filho, mas sou real, existo mesmo e realmente sou Deus. Mas enfim, na verdade não importa se você crê em mim e sim, o importante é que creio em você e por isso estou aqui. Continuando: criei a humanidade, se bem que foi por um acaso. Sonhei certa tarde que havia muita gente em um planeta e quando acordei, eles existiam. Foi quando descobri que era Deus. Eles não sabiam de mim por um tempo, após alguns anos e alguns acontecimentos começaram a me adorar. Pediam-me muitas graças e eu as dava. E essa rotina foi me estressando de tal ponto que não sabia mais o que fazer. As pessoas sempre me pedem as coisas certas para eles, mas por um acaso alguém já pensou em ser certo para as coisas que dou?
- Isso é verdade, mas me diga como foi sua infância?
Deus sorriu, ajeitou-se no divã e disse:
“Não tive infância, sou Deus lembra-se? Então, estou começando a achar que não posso continuar a ser Deus. Todos me pedem coisas, a todo tempo! Coisas que muitas vezes cabem a eles a serem feitas. Este que o problema. Por isso que prefiro os ateus. Não crêem em mim, fazem tudo por si e quando precisam de mim com um olhar pidão de criança de rua não dizem nada, mas escuto tudo... eu não quero que me adorem ou que se ajoelhem ou que paguem penitencias; eu só quero que eles cresçam e vejam que estou por perto, mas, não posso fazer tudo por eles. Eu espero mais deles, ou melhor, de vocês do que vocês de mim! Todos reclamam quando lhes dão mais trabalho do que os cabe certo? E por que Eu tenho que fazer o que não me cabe? Entende? É tão difícil...
Após dizer este relato, o clima se tornou pesado. Matarazzo viu sua vida toda passar diante de seus olhos, sentiu algo estranho em seu interior que não sabia definir ao certo e que, no entanto, batia forte no seu peito como um vulcão, ou melhor, uma explosão, o Big-Bag.
- Você não está brincando não é? Você, quer dizer, o Senhor é Deus mesmo!
“Sim, eu disse que era.”
- Meu Deus do céu! Acho que fiquei louco! – cuidadosamente levantou para não olhar para trás e serviu-se de uma boa dose de um doze anos.
“Não está louco meu filho, na verdade eu só gostaria de desabafar. Não é fácil ficar vigiando o mundo, não poder me abrir com ninguém. Sempre tenho que ser o Deus, Todo Poderoso, que não tem aflições... Não é nada fácil pra eu assumir esse papel... Sempre quis ser pintor! Como pode perceber, eu pintei o mundo todo!”
Os dois caíram numa gargalhada gostosa, Deus riu por sua piada apesar de saber que não teve graça alguma e quando ria o céu trovejava por inteiro e Matarazzo ria e não sabia o porquê do riso, talvez a bebida ou sabe-se lá Deus o porquê... E as risadas continuavam sem parar, riam, riam e riam mais. E quando Matarazzo percebeu estava virando cadeira, era sem querer na verdade, a cadeira virou por tantas vezes que seus pés giravam de tanto rir. Quando se deparou diante de seu divã vazio. Súbito, não ria mais. Seus olhos dividiam um sentimento de alívio e preocupação. Aconteceu mesmo? – indagou-se. Levantou, dirigiu-se ao divã e o tocou. Gelado! Como se fosse banhado por um líquido congelante. Sorriu e pensou tão alto que até Deus ouviu:
“Não sei se aconteceu de verdade, mas não importa! Eu nunca acreditei em Deus e hoje que sei que ele pode ser tão humano quanto eu, é possível que possa existir; só basta acreditar. E pode deixar, meu Velho, farei minha parte! Mas não deixe de fazer a sua!"
E caiu mais uma vez em gargalhadas, agora já estava um pouco bêbado...
E Deus também estava rindo. E com toda certeza também estava bêbado.

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