Gira a manivela e toca-se a música.
A ave colhe o bilhete impresso
E nele, em síntese, o seu destino!
O Realejo come vontades e aspira
Os desejos dos sonhadores.
Coitados!
Mau sabem eles que o homem torpe
E sem nome escreve bêbado
O que para ele não tem sentido!
E no papel que a jovem inocente
e bela e triste e travessa
Ganhara estava escrito:
"O Amor, meus caros, não tem definição, tem pressa!"
E ela sorriu como uma flor toda banhada de sol e pequenamente disse:
Meu senhor, o Amor não tem pressa, e também não pode ser definido, pois é mister que a sua grandeza não possa ser medida pelo homem. Se isso um dia acontecesse o Amor acabaria. Tudo o que o homem pôde definir sucumbiu à sua descrença... O dia que a ciência descobrir o que é o Amor, ele deixará de existir. O mesmo aconteceria com Deus e todos os outros santos, anjos, orixás e suas divindades.
É o homem que tem pressa. Ele é uma locomotiva viva descarrilhada em busca de um progresso que nem mesmo ele entende... Mas não falemos de metafísica! Apenas olha esta rua nua e fria enquanto eu me despeço, de qualquer forma obrigada pelo bilhete impresso...
E num súbito momento a menina se fundiu com a bruma e da mesma forma que amanhece o sol ela desapareceu...
E o velho bêbado sorriu uma interrogação e dentre os soluços da bebedeira bolbulciou algo parecido com isso:
- "Um criança que guarda em si o sentido da vida não faz muito sentido a um velho; mas depois dos setenta anos nada precisa fazer sentido..."
Ele soltou a ave que voou sem pensar em nada. Deixou cair o realejo, que se desmontou inteiro no chão. Foi andando até o fim rua nua e fria e deitou junto ao meio fio. Deu um trago forte no seu conhaque, tossiu, sorriu e, ao som de um realejo distante, morreu.
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